Cultivar e guardar a Criação (Gn 2,15)

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Com cinzas sobre nossas cabeças, começa em breve o tempo da Quaresma. O povo católico veste roxo, os cantos da liturgia lembram a conversão e a penitência. O tempo da Quaresma não é de luto, nem de contemplação dolorosa. É um olhar de esperança. Olhamos para o sofrimento de Cristo no passado e reconhecemos: Deus nos mostrou seu grande amor. Então olhamos para o futuro, para a Ressurreição que virá: como podemos tornar nossa vida um caminho reto para o Deus da Vida e da Graça? A Quaresma é a nossa preparação para a Semana Santa da Paixão e da Ressurreição. É um tempo precioso e essencial. Vamos recordar as lições do Ano Santo da Misericórdia, correr para a Reconciliação enquanto é tempo de perdão.

cartaz-cf-2017-215x300Fraternidade, é o convite da Quaresma. O mundo fraterno é aquele que corresponde com o desejo de Deus Criador. E como anda a fraternidade entre as pessoas? Como anda o respeito pelas criaturas, pela vida, pela saúde do planeta? A fraternidade está em crise. O sonho de um progresso sem Deus, de egoísmo e indiferença, de luxo e miséria, levou a humanidade a um beco sem saída: medo, solidão, violência, exclusão, desperdício e exaustão dos recursos da terra. Quaresma é tempo de fazer um balanço da nossa vida pessoal, e do nosso mundo, para voltar ao caminho proposto por Deus: a solidariedade, a fraternidade, a vida plena. A Igreja toda do Brasil propõe aos fiéis de todas as religiões, e mesmo àqueles que não seguem nenhuma religião, uma campanha, a Campanha da Fraternidade. Já tem mais de 50 anos essa campanha anual, e gerou muitos frutos. Não será diferente este ano a Campanha da Fraternidade que terá como lema “Cultivar e guardar a criação” (Gn 2,15).

Ecologia sob nova luz – Não é de hoje a preocupação da Igreja com o cuidado da natureza. Os estragos produzidos no mundo pela exploração desregrada, pela avidez do lucro, pela ciência desvinculada da ética sempre estiveram entre as preocupações da Igreja. A própria Campanha da Fraternidade, em edições passadas, refletiu sobre o tema da ecologia. Quem não se lembra do tema “Preserve o que é de todos”, de 1979,  “Terra de Deus, Terra de Irmãos”, de 1986, “A Fraternidade e a água”, de 2004, “A Fraternidade e a Amazônia”, de 2007, “A Fraternidade e a vida no planeta”, de 2011 e, por último, “Casa comum, nossa responsabilidade”, de 2016. Esses temas foram conscientizando as diversas gerações, geraram mudanças, mas ainda falta muito para a consciência se tornar cuidado verdadeiro e responsável. O retorno ao tema da Ecologia vem agora reforçado pela palavra autorizada do Papa Francisco que surpreendeu o mundo com uma Carta Encíclica chamada “Laudato Sì” que nos ajuda a vivenciar o tema deste ano com mais esperança e alegria.

Ecologia Integral – O Papa Francisco, desde o início do seu pontificado vem ensinando ao mundo inteiro, com sua linguagem facilmente compreensível, tanto pelos mais simples e iletrados como pelos intelectuais e doutores. Foi assim que o Papa Francisco tratou da Ecologia na sua Carta Encíclica Laudato Sì, que trouxe como novidade alguns aspectos notáveis: Ele não se dirige só aos católicos, mas a toda a humanidade. Ele não fica preso na linguagem do protesto, das condenações, mas fala da Criação de Deus como um dom, um presente que tem as marcas das mãos divinas. Ele assombra a comunidade científica com uma leitura atual, realista e bem fundamentada da situação mundial, que ninguém pode questionar. Ele propõe medidas muito práticas e eficazes, que os movimentos ecológicos ainda não tinham pensado. Ele integra numa única direção a ecologia ambiental e a humana: quando o ambiente humano se degrada, também a natureza se corrompe. Da mesma forma, não se pode salvar o ambiente, os animais em extinção, sem cuidar das pessoas que são excluídas de uma vida digna, da saúde, da educação, da vida plena.

Entre na Campanha – A nossa conversão quaresmal será mais concreta se abraçarmos a Campanha da Fraternidade deste ano que fala sobre os Biomas. É bom acostumar-se com essa palavra. Os diversos biomas apresentados pela CF mostram a grande variedade e riqueza da nossa realidade natural:  Amazônia, Caatinga, Cerrado, Pantanal, Pampas, são exemplos dessa maravilhosa natureza do Brasil. Cada um desses biomas é apresentado juntamente com as pessoas que moram, de longa data, nessa parte do Brasil, os indígenas, os quilombolas, os seringueiros, os ribeirinhos, e assim por diante. A apresentação dos biomas também facilita a que cada região busque conhecer os desafios próprios de sua gente, encontrando soluções apropriadas para os seus problemas específicos. O nosso bioma é a Mata Atlântica. Nela estão as aglomerações urbanas, as grandes indústrias, que poluem e destroem a natureza. A Campanha da Fraternidade vai nos questionar e buscar caminhos para que a vida seja preservada neste nosso chão. É nosso dever de cristãos e também de cidadãos, rezar e trabalhar juntos por um mundo limpo e cheio de vida.

Peço que atentem a estas datas e programas

1. Formação – dia 18 de fevereiro, sábado, haverá um dia de formação, para todos, especialmente o clero, religiosos, seminaristas, ministros, catequistas, palestristas, pregadores, coordenadores de grupos e atividades pastorais, além de pessoas que trabalham nos serviços públicos de meio ambiente, para que falemos a mesma linguagem sobre esse tema.

2. Abertura da Campanha da Fraternidade – em nossa diocese será feita na Catedral Santo Antonio, dia 3 de março, 1ª sexta feira da Quaresma, com missa às 20h00. Peço a cada pároco que tenha na sua paróquia uma equipe de animação da Campanha da Fraternidade. Estes é que são especialmente convidados, junto com o clero, para esta abertura.

3. Textos – Os temas da Campanha devem ser estudados pelos Conselhos de Pastoral e equipes de animação da Campanha. O Texto Base, os subsídios litúrgicos, a Encíclica Laudato Sì, a Mensagem do Papa para o dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação, são subsídios que podem ser motivadores para as homilias, a catequese, os encontros de grupos e ações específicas nas paróquias, em favor do meio ambiente.

4. Os grupos de Famílias – Acompanhados pelo CD com a Leitura orante da Bíblia, os livrinhos de reflexão para grupos são excelentes para movimentar toda a paróquia em torno do tema da Campanha. Ali se encontra a Via-Sacra, meditada a partir do olhar de Maria, um roteiro para ser meditado nas nossas igrejas, como também na oração pessoal.

5. CF e Sociedade – A Campanha não pode permanecer somente na Igreja. Precisa chegar aos ambientes da sociedade que possam contribuir para um mundo melhor. Escolas, Associações de Moradores, clubes de Serviço devem ser convidados a participar das iniciativas das paróquias, bem como as instâncias da Prefeitura, Câmaras Municipais, Organismos ligados ao Meio de Ambiente. Os meios de comunicação sejam acionados para dar plena visibilidade e maior acolhida aos projetos da CF.

6. CF na paróquia – Cada comunidade paroquial, dentro do espírito da Campanha da Fraternidade, promova uma atividade, seja permanente ou pontual, que mostre o cultivo e a guarda da Criação. Como as realidades paroquiais são por vezes semelhantes, será bonito se houver iniciativas unindo diversas paróquias ou mesmo uma Região Pastoral.

7. No dia 9 de abril – no final de semana do Domingo de Ramos, acontece em todo o Brasil a Coleta da Campanha da Fraternidade. É necessário motivar essa coleta da qual, uma parte é destinada à CNBB, para os projetos sociais mantidos pela Caritas, e outra parte permanece no Fundo diocesano de Solidariedade, utilizados no decorrer do ano em projetos sociais.

Quis o Papa Francisco que o dia 1º de setembro, de cada ano, fosse dedicado pelos cristãos católicos como Dia Mundial de Oração pelo cuidado da Criação. Esse dia já vinha sendo celebrado pelos cristãos ortodoxos. Isso quer dizer que a preocupação ecológica deve ser permanente, deve envolver todas as religiões e todas as pessoas de boa vontade. O Papa insiste que o cuidado com as coisas criadas por Deus não é, para nós cristãos, opcional. Nem se trata de um aspecto secundário da nossa espiritualidade. Se cremos num Deus que “se encarnou”, todas as realidades materiais se tornaram aí importantes e dignas da nossa atenção e cuidado. Cristo, o “primogênito de toda a criatura” é que nos convoca a entrar de corpo e alma nesta Campanha.

Fonte: Diocese de Osasco
Por Dom João Bosco, ofm - Bispo Diocesano de Osasco, SP